Cegonhas-brancas. Foto: Samuel Infante

Das cegonhas aos ouriços, centros da Quercus receberam 1261 animais em 2023

As três unidades de recuperação de fauna selvagem geridas pela ONG receberam principalmente aves, mas também mamíferos, anfíbios e répteis. Foram devolvidos 497 animais selvagens à natureza.

Ao longo de 2023, entraram 1349 animais nos três centros geridos em Portugal pela Quercus – Associação Nacional para a Conservação da Natureza, dos quais estavam vivos 1261, informa em comunicado a ONG portuguesa. “Graças à dedicação das nossas equipas e voluntários, 497 destes animais tiveram uma história com final feliz, sendo devolvidos ao seu habitat natural”, indica também.

Em causa estão o Centro de Estudos e Recuperação de Animais Selvagens (CERAS), em Castelo Branco, o Centro de Recuperação de Animais Selvagens de Montejunto (CRASM), no Cadaval, e o Centro de Recuperação de Animais Selvagens de Santo André (CRASSA), no Litoral Alentejano. Estes três centros estão integrados na Rede Nacional de Centros de Recuperação para a Fauna (RNCRF) gerida pelo Instituto de Conservação da Natureza e da Floresta, “com o principal objetivo de receber, tratar e devolver ao seu habitat animais selvagens debilitados, feridos ou órfãos”, de espécies que pertencem à fauna autóctone de Portugal.

Ouriço-europeu no momento da libertação. Foto: Samuel Infante

As aves foram de longe os principais visitantes acolhidos nestes três centros, com um peso de 87% no total de entradas. Em especial as gaivotas (Larus sp.), com 124 entradas, as cegonhas-brancas (Ciconia ciconia), (97 entradas), andorinhas-dos-beirais (Delichon urbicum) (92) e também mochos-galegos (Athene noctua) (85). Quanto aos mamíferos (12%), destacou-se a ordem dos Eulipotyphla (insetívoros), como por exemplo os ouriços (Erinaceus europaeus) (57). Já anfíbios e os répteis continuam a estar menos representados, pois representaram apenas 1% dos ingressos. “No entanto, importa realçar a importância destes animais nos nossos ecossistemas e a igual necessidade de os resgatar e cuidar”, apela a Quercus. 

Nos três centros, entraram no ano passado também várias espécies ameaçadas, incluindo o abutre-preto (Aegypius monachus), a coruja-do-nabal (Asio flameus), a abetarda (Otis tarda) e o milhafre-real (Milvus milvus).

Abutre-preto num dos centros de recuperação da Quercus. Foto: Samuel Infante

Voluntários aceitam-se

Foi durante o mês de Junho que entraram mais animais nos três centros de recuperação de fauna selvagem, num total de 315 novos “pacientes”, que representaram 23% – praticamente um quarto – dos números relativos ao ano todo. “Esta é uma tendência normal nos centros de recuperação de animais selvagens portugueses, visto verificar-se um aumento da presença de aves migratórias que vêm reproduzir-se no nosso país, incluindo também o nascimento e a dispersão de crias”, explica a Quercus.

Assim sendo, essa é também uma “época crucial” para o programa de voluntariado nos centros geridos por esta ONG, que aceita “pessoas de qualquer área de formação, com disponibilidade para ajudar na recuperação destas espécies”. Em 2023, no âmbito deste programa, apoiaram a Quercus cerca de 169 voluntários.

Libertação de mochos-pequenos-d’orelhas. Foto: Samuel Infante

Quanto à forma como chegaram ao CERAS, ao CRASM e ao CRASSA, a maior fatia destes animais, 38% do total, foram ali entregues pelos agentes do SEPNA – Serviço de Proteção da Natureza e Ambiente, ligado à GNR. Os vigilantes da natureza e outros técnicos que trabalham com o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas deram também um contributo importante, sendo responsáveis pela entrega de outros 38%. “A estreita relação com as autoridades, garantindo a sua formação e sensibilização, é essencial para o bom funcionamento” da Rede Nacional de Centros de Recuperação de Fauna Selvagem, sublinha a Quercus, pois dessa forma o resgate faz-se “de forma correta e atempada, melhorando as hipóteses de sobrevivência dos animais”. 

Quais foram as causas de entrada?

Praticamente um terço dos ingressos, num total de 408 (30%) deram-se devido a quedas do ninho ou situações em que os pais tinham morrido ou estavam desaparecidos. Importantes foram também os traumatismos de origem desconhecida, que representaram um quinto do total, com 288 (21%).

“Complementarmente, é importante salientar as entradas por origem antropogénica”, salienta esta associação. Seja a perseguição direta por tiro, com 25 casos detetados (2%) ou envenenamento (três casos, 0,2% do total) ou ainda as situações de cativeiro (63, 5% do total), apesar de serem ilegais, “continuam a ocorrer recorrentemente”, alertam.

Devolução de um texugo à natureza. Foto: Samuel Infante

“Ainda em maior expressão, verificam-se causas por interações antropogénicas indiretas, associadas a interações com infraestruturas humanas (estradas, linhas elétricas, vedações/arame farpado) e até poluição (por exemplo, anzóis). Importa também referir que das entradas causadas por ataque de animal, algumas foram por ataque de animais domésticos (na sua maioria gatos, mas também por cães), um fator também associado à atividade humana.”

No final do ano, ainda se encontravam em recuperação 58 animais entre os que tinham dado entrada. O ritmo anual de ingressos, aliás, tem vindo a aumentar, o que pode dever-se a três razões apontadas pela Quercus: maior sensibilidade da população e das autoridades para este tema, aumento da visibilidade dos CRAS a nível nacional através da aposta na divulgação online, um horário de receção de animais mais alargado e maior consistência no trabalho realizado. 


Agora é a sua vez.

Caso encontre algum animal selvagem debilitado, ferido ou órfão, a Quercus explica que podem contactar-se as entidades oficiais para procederem à recolha do animal e o encaminharem para os Centros de Recuperação de Animais Selvagens, através da Linha SOS Ambiente 808200520 ou dos respetivos contactos de cada centro.

Pode encontrar aqui os contactos das autoridades e dos centros que funcionam em Portugal, incluindo os três que são geridos por esta ONG.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.