Tartaranhão-caçador. Foto: Dennis Jacobsen/Shutterstock

Portugal e Espanha únem-se para proteger sisão, abetarda e tartaranhão-caçador

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O LIFE Agroestepas Ibéricas vai conservar aves em declínio como o sisão, a abetarda ou o tartaranhão-caçador em 13 espaços da Rede Natura, três deles em Portugal (Évora, Castro Verde e Campo Maior).

O projecto – apresentado a 29 de Março pela Sociedade Espanhola de Ornitologia (SEO/Birdlife), entidade que o coordena – vai procurar soluções para apoiar uma gestão agrária tradicional que beneficie o sector e que permita a recuperação das populações de aves em declínio.

Tartaranhão-caçador. Foto: Dennis Jacobsen/Shutterstock

Co-financiado pela União Europeia através do programa LIFE Natureza, este projecto a cinco anos está orçado em mais de três milhões de euros, boa parte dos quais serão usados para favorecer boas práticas agrárias.

O trabalho será realizado em 13 espaços da Rede Natura 2000 (mais concretamente Zonas de Protecção Especial para Aves), seis na Extremadura, quatro em Aragão e três no Alentejo (Évora, Castro Verde e Campo Maior). Em Portugal, os sócios beneficiários do projecto são a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), a Liga para a Protecção da Natureza (LPN) e o CIBIO (Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos da Universidade do Porto); o projecto conta com o apoio do Governo português através do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

Censo de aves. Foto: SEO/Birdlife

Durante cinco anos serão desenvolvidos e testados modelos de compromissos e compensações que possam beneficiar agricultores e criadores de gado e que melhorem a sobrevivência e o êxito reprodutor das aves mais ameaçadas ligadas à agricultura.

“O LIFE Agroestepas Ibéricas (…) quer travar o declínio das aves agrárias mais ameaçadas através da aliança entre a administração, os agricultores e as organizações conservacionistas”, explicou, em comunicado, Marcelino Cardalliaguet, da SEO/Birdlife na Extremadura espanhola.

Por exemplo, os modelos de ajuda à conservação das aves nas propriedades agrícolas serão desenhados com a directa participação e compromisso dos agricultores.

Abetarda. Foto: Gabi Sierra
Abetarda. Foto: Gabi Sierra

No final do projecto, os resultados e as alianças conseguidas deverão ser úteis para desenhar ajudas específicas aos agricultores que protejam aves ameaçadas no próximo quadro de apoios da Política Agrícola Comum (PAC).

Espécies destacadas no LIFE Agroestepas Ibéricas

O projecto centra o seu trabalho em três das espécies de aves mais ameaçadas das zonas rurais, como o sisão (Tetrax tetrax), a abetarda (Otis tarda) e o tartaranhão-caçador, também conhecida por águia-caçadeira (Circus pygargus). Segundo a SEO/Birdlife, “todas elas registaram graves tendências negativas das suas populações nos últimos 15 anos”.

Segundo dados dos censos nacionais em Espanha, o sisão-comum sofreu um declínio de 47,6% em apenas 11 anos (entre 2005 e 2016), sendo particularmente grave a tendência na Extremadura nesse mesmo período, com uma redução de 64%.

Sisão. Foto: JM Simón

Em Portugal, a redução registada foi de 49% (entre 2003-2006 e 2016).

A abetarda tem uma tendência negativa em Espanha de mais de 30% (período 2005-2019).

O tartaranhão-caçador também está em declínio, com 23% (entre 2006 e 2017). Em Portugal, o último censo nacional da espécie revelou uma perda de 80% da população nos últimos 15 anos.

Para ajudar estas espécies, o projecto LIFE vai, além de fazer compromissos com as propriedades agrícolas, recuperar antigas variedades de cereais já em desuso mas mais adaptadas às condições locais de precipitação escassa e altas temperaturas, o que pode permitir aos agricultores usar menos produtos químicos.

Colheita do cereal. Foto: SEO/Birdlife

Também será desenvolvida uma tecnologia de inteligência artificial para localizar ninhos – e evitar os trabalhos agrícolas perigosos para eles – através de fotos térmicas realizadas a partir de drones a uma altura segura. Esta tecnologia já foi aplicada pela Universidade de Helsínquia para outras espécies.

“A Península Ibérica alberga as principais populações de aves agroestepárias da Europa e o projecto que hoje apresentamos quer dar a conhecer a importância da Extremadura, Aragão e Alentejo como refúgio para estas espécies”, comentou Ana Carricondo, coordenadora de programas de Conservação da SEO/Birdlife. “Para isso, é imprescindível unir esforços e interesses comuns para conseguir um bom estado de conservação dos habitats agrícolas, tendo em conta as necessidades dos sectores produtivos e das pessoas que os gerem”, acrescentou.


Saiba mais.

Conheça aqui um projecto para conservar ninhos de tartaranhão-caçador em Castro Verde, desenvolvido pela Direcção Regional de Conservação da Natureza e Florestas do Alentejo, do ICNF, e pelo CIBIO.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.