Marcadas três crias de abutre-preto no Alentejo

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Três crias de abutre-preto, duas fêmeas e um macho, foram marcadas este Verão com anilhas e emissor GPS/GSM na Herdade da Contenda, em Moura, onde nasceram. O seu acompanhamento vai ajudar a saber mais sobre esta espécie Criticamente Em Perigo.

Estas três crias nasceram no âmbito de um esforço de conservação que acontece na Herdade da Contenda, no concelho alentejano de Moura, onde vive a segunda maior colónia de abutre-preto (Aegypius monachus) do país. Ali nasceram no ano passado sete crias.

Foto: Herdade da Contenda

Em Moura luta-se por trazer esta espécie de volta, assim como se faz nos outros núcleos reprodutores no Douro Internacional e no Tejo Internacional. Em Novembro do ano passado, a organização Rewilding Portugal confirmou uma nova colónia desta espécie no nosso país, na Reserva Natural da Malcata, com um total de três ninhos.

Actualmente há em Portugal cerca de 50 casais de abutre-preto.

Foto: Herdade da Contenda

Este Verão foram marcadas três crias na Contenda, Moura, Safara e Santo Aleixo, disse à Wilder Pedro Rocha, administrador executivo da Herdade da Contenda, E.M e antigo director do Parque Natural do Vale do Guadiana.

As crias foram anilhadas por Carlos Pacheco, biólogo e técnico em projectos de conservação e monitorização de aves selvagens, com anilhas (cor e metálica) e emissores GSM, cedidos pela Vulture Conservation Foundation (VCF). A acompanhar as sessões de anilhagem esteve o veterinário David Delgado, da Liga para a Protecção da Natureza (LPN), organização que coordena a monitorização da população nidificante da Herdade, com o apoio da Herdade da Contenda.

Além da marcação das aves “foram retirados dados biométricos, recolhidos dados vitais e retiradas penas e sangue para análise”, acrescentou Pedro Rocha.

Neste momento estão a ser seguidos sete abutres nascidos na Contenda em anos anteriores. “Todos os abutres que foram marcados até ao momento encontram-se vivos, de saúde e com muitas movimentações entre Portugal e Espanha”, explicou o responsável. “Sabe-se que têm visitado outras colónias de abutre-pretos em Espanha, com dispersões máximas de 200 quilómetros desde a Contenda.”

“O comportamento dispersivo varia bastante entre indivíduos. Por exemplo, o abutre-preto Monsanto tem utilizado uma área muito vasta de mais de um milhão de hectares, enquanto outros indivíduos utilizam áreas de ‘apenas’ algumas dezenas de milhar de hectar, distribuídas entre Portugal e Espanha.”

Número aquém do esperado 

Este ano foram identificados pelo menos 10 casais nidificantes de abutre-preto na Herdade da Contenda. “O número de crias que nasceu não é conhecido. Sabe-se que nasceram pelo menos quatro crias, mas provavelmente terão nascidos mais duas ou três”, adiantou o responsável.

Foto: Herdade da Contenda

Além das três crias marcadas foi encontrada uma cria no chão, debaixo do ninho, em situação de debilidade. “Após prestação dos primeiros socorros, o jovem abutre foi encaminhado para o Centro de Recuperação de Animais Silvestres (LxCRAS) de Monsanto por parte do ICNF/DRCNF Alentejo. A análise efetuada no LxCRAS revelou que o abutre tinha ingerido vários brincos de identificação pecuária. As análises preliminares revelaram ainda alguns problemas de desenvolvimento ósseo, cujas causas estão a ser apuradas neste momento.”

A cria mais precoce já iniciou dispersões, a partir de 15 de Agosto, “de cerca de 20 quilómetros para norte e sul do ninho, voltando ainda ao ninho”. “Espera-se que as crias deixem os ninhos a partir de Setembro/Outubro, com visitas cada vez menos frequentes com o avançar do ano. As maiores dispersões são esperadas com o final do Inverno e início da Primavera.”

Para Pedro Rocha, as cerca de quatro crias de 2022 representam um número que “ficou aquém do esperado”. “Apesar da manutenção (ou eventual aumento) dos casais nidificantes relativamente a anos anteriores, o número de crias que atingiu a fase voadora é baixo.”

Foto: Herdade da Contenda

“Sabemos que alguns ninhos derrocaram em período de nidificação em virtude de ventos fortes”, por exemplo.

A Herdade da Contenda – propriedade da Câmara Municipal de Moura com 5.300 hectares onde, em 2012, começaram a ser instalados vários ninhos artificiais de abutre-preto para atrair casais reprodutores para a região – continua a fazer a gestão quotidiana para salvaguardar as áreas de nidificação.

Segundo Pedro Rocha, faz-se trabalho preventivo para recuperar ninhos e mantêm-se as necessárias condições de tranquilidade. “Nos últimos dois anos foram ainda disponibilizadas 10 novas plataformas de nidificação e recuperados mais de 15 ninhos”.

Foto: Herdade da Contenda

Além disso, foram feitas várias intervenções de incremento da resiliência das áreas de nidificação aos incêndios (aceiros e mosaicos em áreas de mato) e realizadas sementeiras para fomento do coelho-bravo. Actualmente, “a densidade do coelho-bravo na Contenda está a níveis muito baixos”, exceptuando alguns “pontos localizados de alguma densidade”.

“O campo de alimentação (CAAN) está em atividade, sendo providenciado alimento em função dos períodos mais críticos para a nidificação do abutre-preto.”


Agora é a sua vez.

Eduardo Santos, da LPN, e Gonçalo Elias, do portal Aves de Portugal, dão-lhe as dicas que o vão ajudar a observar abutres-pretos. Leia tudo aqui.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.