tronco de uma árvore com musgo
Foto: Wilder/arquivo

ONG alertam que nova PAC favorece agricultura insustentável em Portugal

Os fundos para a nova Política Agrícola Comum (PAC) “continuarão a favorecer a agricultura insustentável em Portugal”, amplificando a perda da biodiversidade, alerta hoje a associação ZERO.

Em causa estão os fundos públicos do próximo quadro de apoios da PAC (2023-2027), no valor de 270 mil milhões de euros. A ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável e o European Environmental Bureau (EEB) alertam hoje, em comunicado, para “o caminho desastroso que segue a atual planificação da aplicação dos fundos públicos para a agricultura portuguesa”.

As associações analisaram o plano estratégico que Portugal deverá pôr em consulta pública (final) a partir do início de Agosto deste ano. O documento deverá ser enviado à Comissão Europeia em Dezembro. 

Uma das maiores críticas é a aposta nos grandes regadios colectivos de iniciativa estatal, como a recentemente aprovada barragem do Crato (Pisão) e os seus perímetros de rega, especifica o comunicado da ZERO.

Segundo a associação, a expansão da agricultura dependente do regadio “provocará maior intensificação do uso e ocupação dos solos” e vai acelerar o “desaparecimento das paisagens tradicionais, especialmente no Alentejo”.

“O mosaico de campos de cereais secos, de pastagens, de terras em pousio, bem como do montado e outros sistemas agroflorestais extensivos, continuará a ser transformado em monoculturas intensivas de grande escala”. 

Ainda no final de Maio, a Liga para a Protecção da Natureza (LPN) denunciou o impacto da agricultura intensiva sobre habitats raros e prioritários na Costa Sudoeste, no Alentejo. A associação informou a Comissão Europeia sobre a destruição total de cinco charcos temporários mediterrânicos nesta área protegida. Estes são “habitats prioritários cuja conservação foi inclusivamente alvo de financiamento europeu durante mais de cinco anos”, recorda a LPN, num comunicado enviado à Wilder.

E já em Fevereiro, a ZERO alertou para a ameaça de um novo projecto de agricultura intensiva no Alentejo, junto a Beringel, no concelho de Beja, que está a destruir plantas ameaçadas. Em causa está o arranque de um olival tradicional, onde existiam populações importantes de quatro espécies de flora ameaçadas.

Também as aves não escapam às ameaças de uma agricultura insustentável. Segundo a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), os maiores problemas para as aves são a “degradação dos meios rurais e a intensificação da agricultura” que coloca “muitas espécies em queda livre”. Entre as espécies que já estão a ser afectadas estão o mocho-galego (Athene noctua), o alcaravão (Burhinus oedicnemus) e o tartaranhão-cinzento (Circus cyaneus).

“A agricultura é a maior causa do declínio das populações de fauna e flora selvagens na Europa e é também uma grande contribuinte para o aquecimento global.”

Segundo a ZERO, as medidas de apoio à agricultura de alto valor ambiental, dentro da Rede Natura 2000, não são suficientes. Por isso, prevê, “registar-se-ão ainda mais perdas de sistemas agrícolas importantes para a manutenção da biodiversidade”. 

Os ambientalistas receiam que pouco vá mudar com esta PAC, “com a maior parte dos fundos públicos a serem alocados para empreendimentos agrícolas com enormes impactos ambientais”.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.