Era e as crias. Foto: Programa de Conservação Ex-Situ

Centro em Silves consegue 15 crias de lince-ibérico este ano

Este ano já nasceram 15 crias no centro de Silves, mais cinco do que no ano passado, foi hoje revelado. Conheça as histórias por detrás de algumas das mães desta sétima temporada de reprodução de lince-ibérico em cativeiro em Portugal.

 

Em Portugal, o esforço de reprodução do lince-ibérico (Lynx pardinus) em cativeiro, para ajudar a restabelecer as populações da espécie na natureza, começou com apenas quatro casais em 2010: Azahar e Drago, Erica e Enebro, Era e Calabacín e Espiga e Daman. Este ano os nomes são outros. Todos menos um, Era.

Hoje com nove anos, Era é uma das seis fêmeas que foram emparelhadas para a temporada de reprodução de 2016/2017 no Centro Nacional de Reprodução do Lince-Ibérico (CNRLI). Desde que este centro abriu portas e recebeu o seu primeiro lince, a 26 de Outubro de 2009 (Azahar, o lince com nome de laranjeira e que hoje vive no Jardim Zoológico de Lisboa), já ali nasceram quase 100 felinos de barbas e orelhas com ponta em pincel. No ano passado nasceram e sobreviveram 10 crias.

Este ano, juntamente com o macho Fado, Era teve duas crias a 17 de Março, segundo uma nota do Programa ibérico de Conservação Ex-Situ (ou seja, fora das zonas de distribuição natural). No ano passado, a única cria deste casal acabou por morrer após dois dias de  vida. Desta vez, o resultado foi diferente.

 

Era e as crias

 

A 17 de Março, Era pariu “no meio de arbustos no seu cercado”, informa a mesma nota. A 24 de Março, levou as duas crias para dentro de uma caixa ninho, “sendo então possível confirmar o primeiro parto normal, com êxito, da Era nos seus nove anos de existência”.

Era não nasceu em cativeiro, como tantos outros linces. Nasceu na natureza, em plena Serra de Andújar, em Espanha. Segundo a nota, esta fêmea teve “enormes problemas de adaptação ao cativeiro” e “está a ser medicada há seis anos no CNRLI. Esses problemas de adaptação terão condicionado o seu bem-estar, ansiedade e agressividade e reprodução”. Mas, por estes dias, Era “parece demonstrar instinto maternal apurado e as crias seguem o seu desenvolvimento normal”, acrescenta.

Ao contrário de Era, Fresa, é uma mãe experiente. Em 2015 deu à luz três crias (um parto a que uma equipa da Wilder assistiu em directo, no CNRLI) e no total já teve 15 crias naquele centro. Este ano, Fresa – a maior fêmea de Silves, com 14 quilos – foi emparelhada com Hermes e pariu quatro crias na noite de 26 de Março, na caixa-ninho da sua instalação. “É a segunda ninhada de quatro crias da Fresa e foi a primeira ninhada de Hermes no CNRLI”.

Biznaga, que foi mãe pela primeira vez em 2011, e Drago foram responsáveis pelo primeiro parto desta temporada, a 28 de Fevereiro. As três crias “começam já a sair da caixa ninho, aos 30 dias de idade, e prosseguem o seu desenvolvimento normal”.

 

Jabaluna, uma cria que marcou a reprodução em cativeiro, foi mãe

Três das 15 crias do CNRLI nasceram a 25 de Março, filhas de Jabaluna e Jerte. Têm um “aspecto e vitalidade normais”. E uma mãe especial. Esta fêmea primeiriça, hoje com cinco anos, marcou a história da reprodução em cativeiro da sua espécie.

 

Jabaluna e as crias

 

Jabaluna nasceu em Março de 2012 no centro andaluz El Acebuche. Mas a sua mãe, Boj, abandonou-a pouco depois. Jabaluna, uma cria ainda sem nome, passou uma semana em cuidados intensivos numa incubadora. Acabou por protagonizar a primeira vez que um centro de reprodução conseguiu que uma mãe aceitasse de volta uma cria que tinha abandonado.

Agora, Jabaluna foi mãe pela primeira vez.

 

 

“Para fêmea inexperiente, comporta-se como esperado e manifesta comportamento maternal normal, apesar de algumas hesitações previsíveis”, revela a nota de imprensa. As “crias, na sua caixa ninho de campeio, seguem o seu comportamento normal”.

Flora e Madagáscar tiveram três crias, a 28 de Março. “Flora terá parido (…) num ninho no meio da vegetação no fundo da sua instalação, que partilha com o macho Madagáscar”, segundo a nota. “O parto foi confirmado apenas dia 29 de Março quando Flora moveu três crias do seu ninho para outro ninho na vegetação relativamente perto de onde estava originalmente.” Hoje, as três crias estão bem e “o Madagáscar parece visitar mãe e crias por volta do meio-dia de dia 29/03”.

Segundo o Programa Ex-Situ, ter ambos os progenitores com uma ninhada na mesma instalação partilhada “é novidade absoluta no CNRLI”. Mas o que é certo é que os animais “parecem lidar bem com a circunstância”, tanto mais que isto já foi experimentado com êxito pelo centro de reprodução El Acebuche, na Andaluzia, em 2016. “Será curioso observar, pela primeira vez, o papel do macho no crescimento e desenvolvimento das crias.”

Com estas três novas crias, a Flora já pariu 11 crias no CNRLI, sete das quais já foram reintroduzidas ao abrigo do Programa LIFE+ Iberlince na Península Ibérica.

Por seu lado, Madagáscar, com dois anos, é um macho fundador proveniente da população do Parque Nacional de Doñana, tendo passado por El Acebuche, e geneticamente muito importante para a manutenção da diversidade genética da espécie para o futuro. Foi pai da sua primeira ninhada no Programa Ex Situ do Lince Ibérico.

Além destas 15 novas crias em Silves, a equipa do centro está ainda à espera de saber se a fêmea Juromenha – a última potencial gestante em 2017 no CNRLI – está grávida como resultado da primeira tentativa de inseminação artificial realizada nesta espécie.

O lince-ibérico é uma espécie classificada desde 22 de Junho de 2015 como Em Perigo de extinção, depois de anos na categoria mais elevada atribuída pela União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), Criticamente em Perigo.

Actualmente existem 483 linces-ibéricos na natureza, segundo os resultados definitivos do censo de 2016, revelados hoje pelo programa Iberlince. A maioria, 397, está nas populações da Andaluzia (Doñana-Aljarafe e Serra Morena: Guadalmellato, Guarrizas e Andújar-Cardeña). Além destes 397 animais, 19 vivem em Portugal, no Vale do Guadiana; 28 em Matachel (Badajoz), 23 em Montes Toledo (Toledo) e 16 na Serra Morena Oriental.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Siga a nossa série “Como nasce um lince-ibérico” e conheça os veterinários, video-vigilantes, tratadores e restante equipa do Centro Nacional de Reprodução (CNRLI) em Silves.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.