Paulo Silveira com o espécime-tipo de Calendula. Foto: PressUA

Investigadores descobrem para a Ciência novas espécies de calêndula em África

Investigadores da Universidade de Aveiro (UA), em colaboração com equipas de outras instituições, descobriram duas novas espécies e oito novas subespécies de planta, neste caso, de calêndula, no norte de África.

A descoberta das novas espécies (C. davisii and C. oualidii) e subespécies (da C. suffruticosa) foi feita em momentos distintos. Em alguns casos, os investigadores aperceberam-se que se trataria de novas espécies e subespécies durante os trabalhos de campo, ao visitar as respetivas populações, explicou, em comunicado, Paulo Silveira, professor do Departamento de Biologia da UA que coordenou os estudos. Noutros casos, acrescentou, foi durante o estudo dos espécimes no herbário depois de visitar as populações das plantas ou, mais raramente, ainda antes dessa visita, porque muitos espécimes colhidos por outros botânicos não continham os frutos necessários para a identificação e caracterização segura destas plantas.

Paulo Silveira com o espécime-tipo de uma Calendula. Foto: PressUA

Os trabalhos de campo decorreram na Tunísia, em abril de 2009, em Marrocos (abril de 2010, abril de 2011, junho de 2012, março de 2013) e na Argélia em maio de 2014.

O trabalho laboratorial foi realizado no Laboratório de Botânica e no Herbário da Universidade de Aveiro.

Nas primeiras expedições, Paulo Silveira trabalhou sozinho. A partir de junho de 2012, a doutoranda Ana Carla Gonçalves passou a participar no âmbito da revisão taxonómica do género e no âmbito do seu doutoramento sob orientação de Paulo Silveira.

Embora a divulgação mais recente deste longo trabalho seja de 2023, o docente e investigador explicou que, normalmente, não se divulga uma espécie nova logo depois de ser descoberta, mas sim, apenas depois de estar devidamente estudada e publicada, sendo ambas tarefas demoradas. A revisão taxonómica do género foi publicada um artigo da revista Phytotaxa.

A importância do trabalho de campo

A maioria destas espécies são próprias de montanha: desde as montanhas Tazekka, no Atlas Médio, passando pelo Rif e Bokoya, em Marrocos, até Djurjura, na Argélia.

Calendula suffruticosa subsp. boccoyana, por exemplo, embora tenha ficado com o nome das montanhas Bokoya, pode surgir a altitudes relativamente baixas, em recifes costeiros.

“Foi muito importante contactar com a variabilidade morfológica das plantas do género Calendula no campo, pois há variações que ocorrem dentro de certas populações que não são relevantes taxonomicamente e complicam a análise se o estudo for feito apenas no herbário, em que os espécimes estão fora do contexto da respetiva população de onde foram retirados”, explicou Paulo Silveira. “Na maioria dos casos as diferenças são subtis, sobretudo no caso das novas subespécies”, acrescentou.

Segundo este investigador, a principal razão de ainda não terem sido descobertas antes, ou publicadas como novas espécies ou subespécies, tem a ver com a dificuldade de perceção, até então, do papel dos aquénios – tipo de fruto normalmente seco, com origem em um ou mais carpelos, que não se abre espontaneamente, contendo, tipicamente, uma semente – na taxonomia (classificação científica) do género, havendo muitos espécimes de herbário que não continham esses frutos e, por isso, não eram identificáveis. Paulo Silveira acrescentou que antes havia também lacunas de trabalho de campo na região.

Os estudos desenrolaram-se no âmbito dos projetos do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM) através de fundos nacionais, envolvendo a bolsa de doutoramento da Ana Carla Gonçalves da FCT/UNESCO e com financiamento do programa europeu SYNTHESYS, que tornou possível visitas a herbários em Londres.

O trabalho até agora desenvolvido sobre o género Calendula resultou na publicação de dois capítulos de livros internacionais e seis artigos em revistas indexadas.

Ao longo dos anos foram várias as parcerias, incluindo com os botânicos dos países visitados – como os professores Ahmed Ouhammoud, em Marrocos (Marraquexe) e Rachid Amirouche, em Argel (Argélia) – e em Portugal: Estrela Figueiredo, presentemente na Universidade Nelson Mandela (África do Sul), Leonor Morais do Instituto Superior Técnico (ISA, Lisboa), Helena Oliveira, também do CESAM/DBio, João Loureiro e Silvia Castro – ambos antigos alunos da UA, atualmente professores na Universidade de Coimbra -, e o professor Jorge Paiva, investigador aposentado dessa mesma universidade.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.