Coruja-das-torres. Foto: Carlos Delgado/WikiCommons

Por que há aves que voam e outras não?

Cientistas estudaram centenas de aves em colecções de museus de História Natural e descobriram um conjunto de características que todas as aves que voam têm em comum. Estas “regras” podem ajudar a perceber como os dinossauros, antepassados das nossas aves, começaram a voar.

As aves podem voar. Pelo menos a maioria pode. Aves que não voam, como os pinguins e as avestruzes, aperfeiçoaram estilos de vida que não exigem o voo.

Mas há muito que os cientistas não sabem sobre como diferem as asas e as penas das aves que não voam das asas e penas das aves voadoras.

Num novo estudo publicado na revista PNAS, uma equipa de cientistas estudou centenas de aves guardadas nas colecções de museus de História Natural e descobriu um conjunto de características de penas que todas as aves voadoras têm em comum. Estas “regras” dão pistas sobre como os dinossauros antepassados das aves modernas passaram a conseguir voar e que dinossauros eram capazes de voar.

Nem todos os dinossauros evoluíram para aves mas todas as aves modernas eram dinossauros. As aves fazem parte do grupo de dinossauros que sobreviveu quando um asteróide colidiu com a Terra há 66 milhões de anos. Muito antes da colisão deste asteróide, alguns dinossauros começaram a desenvolver penas, antes de serem capazes de voar. Inicialmente, o objectivo das penas poderá ter sido para proteger estes animais do calor e do frio ou para atrair parceiros.

Para saber mais sobre o voo nos dinossauros, Jingmai O’Connor, um paleontólogo no Field Museum de Chicago, e o investigador e ornitólogo Yosef Kiat, do mesmo Museu, juntaram esforços e começaram a investigar.

“Yosef estava a investigar características como o número de tipos diferentes de penas de voo em relação ao comprimento do osso da asa no qual se encontravam e a assimetria nas penas de voo das aves”, explicou, em comunicado, Jingmai O’Connor, curador associado no Museu para os fósseis de répteis e que se especializou nas primeiras aves. “No âmbito da nossa colaboração, Yosef conseguiu encontrar essas características em fósseis que têm entre 160 e 120 milhões de anos e assim estudar a história evolutiva das penas.”

Este ornitólogo estudou as penas de todas as ordens de aves dos nossos dias, examinando espécimes de 346 espécies diferentes preservados em museus de todo o mundo. Ao estudar asas e penas de aves tão diferentes como colibris, águias, pinguins ou pelicanos, Yosef reparou num número de características persistentes entre as espécies que conseguem voar. Por exemplo, além das penas assimétricas, todas as aves voadoras têm entre 9 a 11 penas primárias. Nas aves que não voam esse número varia bastante; os pinguins têm mais de 40 enquanto os emus não têm nenhuma.

“É realmente surpreendente que com tantos estilos de voo que podemos encontrar nas aves modernas todas elas partilham esta característica de ter entre 9 e 11 penas primárias”, comentou Kiat.

Ao aplicar esta informação a todas as aves, Kiat e O’Connor também descobriram que demora muito tempo para as aves desenvolverem um número diferente de penas primárias. “Esta característica só muda depois de períodos de tempo geológico muito longos.”

Além das aves modernas, os investigadores também estudaram 65 espécimes fósseis representando 35 espécies diferentes de dinossauros com asas e aves que já se extinguiram. Ao aplicar o que descobriram sobre as aves modernas, os cientistas extrapolaram a informação aos fósseis. “Basicamente podemos sobrepor o número de penas primárias e a forma dessas penas para determinar se um fóssil de ave poderia voar”, comentou O’Connor.

Por exemplo, os investigadores olharam para o dinossauro Caudipteryx, que tinha penas mas que não voava. O Caudipteryx tinha nove penas primárias mas essas penas eram quase todas simétricas e as proporções das suas asas tornavam o voo impossível. Os cientistas dizem que é possível que o Caudipteryx tenha tido um antepassado capaz de voar mas que essa característica se tenha perdido na altura em que o Caudipteryx tenha aparecido em cena. Dado que demora muito tempo para que o número de penas primárias mude, o Caudipteryx manteve as suas nove penas primárias.

Entretanto, outros pareciam prontos para o voo, incluindo o Archaeopteryx e o Microraptor.

Estes investigadores acreditam que este estudo pode ajudar a perceber melhor as origens do voo nos dinossauros. “Só recentemente os cientistas se aperceberam que as aves não são os únicos dinossauros voadores”, comentou O’Connor. “Têm havido debates sobre se o voo nos dinossauros evoluiu de uma só vez ou em várias alturas. Os nossos resultados sugerem que o voo evoluiu de uma só vez nos dinossauros mas temos de reconhecer que o nosso conhecimento sobre este tema ainda está no início.”

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.