Foto: Pixabay

Alunos de Vila Nova de Monsarros filmaram “A visita de um pica-pau”

Ao longo dos últimos anos, professor e alunos filmaram as aves que frequentam os comedouros e a caixa-ninho instalados no recreio. E agora, mesmo confinados em casa, uniram esforços e realizaram um documentário sobre um pica-pau visitante.

 

Na escola de Vila Nova de Monsarros, uma freguesia no concelho de Anadia, distrito de Aveiro, as aves e outras espécies selvagens são visitantes habituais e nunca ignorados.

Se tiverem atenção, os alunos conseguem observar muitas aves mais comuns, incluindo “melros, pardais, alvéolas-enlutadas, verdilhões, pintassilgos, chapins azuis, reais e rabilongos, gaios, pegas-rabudas, milheirinhas, toutinegras e trepadeiras”, exemplifica o professor André Brandão. Já viram também dois sapos-comuns “que suscitaram grande curiosidade.”

 

Fachada da escola de Vila Nova de Monsarros. Foto: André Brandão

 

O cenário ali à volta é vantajoso: “A escola fica num dos limites da aldeia, sendo que a oeste confronta com floresta e terrenos agrícolas que se prolongam junto às margens do Rio da Serra, afluente do Cértoma”, descreve este professor, que está a leccionar a turma mista do primeiro e terceiro anos.

 

Parte da paisagem que é observada a partir da escola. Foto: André Brandão

 

Perante esta biodiversidade, os alunos da escola não ficaram parados. No ano lectivo de 2018/2019, por exemplo, colocaram-se comedouros numa das árvores do recreio. “Fizemo-lo porque ficava em frente à janela da casa de banho dos rapazes, permitindo observar sem ser observado, devido ao reflexo dos vidros”, explica André Brandão. Mais tarde, colocaram ainda outro no vidro da janela.

 

 

Comedouro instalado na árvore do recreio da escola, feito com uma garrafa vazia. Foto: André Brandão

 

Mas foram ainda mais longe. “Assim que alguns alunos começaram a relatar observações, começámos a tentar documentar as visitas aos comedouros, de modo a convencer os mais cépticos ou aqueles que ainda não tinham tido a sorte de um avistamento.”

As imagens captadas permitiram também comparar essas aves com as ilustrações dos guias. No início, os registos tinham “péssima qualidade”, mas tudo melhorou quando o telemóvel foi substituído por máquina de filmar e tripé. Dessa forma, adianta o professor, “conseguimos perceber o que se passava nos comedouros e caixa-ninho, enquanto trabalhávamos, normalmente, na sala de aula.”

 

Vista a partir da janela da casa-de-banho dos rapazes. Foto: André Brandão

 

Já este ano lectivo, a única caixa-ninho instalada no recreio – e que tinha sido anteriormente ocupada por chapins – começou a ser visitada por um pica-pau, recorda o professor. “Ver esta ave a tentar alargar o buraco de uma caixa-ninho, com tantas árvores para explorar, deixou-nos surpreendidos.”

Entretanto, André Brandão e os seus alunos meteram mãos à obra. Entre Janeiro e Fevereiro captaram imagens do pica-pau, que “passou duas ‘temporadas’ de uma semana a explorar aquelas árvores” da escola. O objectivo era acompanhar a ave até às férias de Verão, mas a pandemia e o confinamento interromperam o projecto: ainda ninguém sabe se o pica-pau chegou a nidificar no local ou se a caixa-ninho foi ocupada por este ou outros visitantes.

Ainda assim, não desistiram. Cada aluno pesquisou mais em casa sobre pica-paus. Depois, com base na informação recolhida, a turma criou um texto que serviu de narração ao documentário e cada um gravou uma parte em casa com ajuda da família. E assim, ao longo deste pequeno filme com imagens captadas no recreio da escola, intitulado “A visita de um pica-pau”, pode ouvir-se cada um dos alunos a descrever como são estas aves e como se comporta a espécie.

 

 

Chapins e outras aves

Mas esta não foi a primeira experiência do género. Nos últimos anos, André Brandão tem feito alguns filmes com alunos de Vila Nova de Monsarros, incluindo experiências com ‘stopmotion’.

No ano lectivo passado, aproveitando a captação de imagens de chapins-reais que nidificaram na caixa-ninho e a investigação feita por alunos, a turma de então realizou um documentário intitulado “Chapins e outras aves”.

 

Chapim-real. Foto: Sylvain Haye/Wiki Commons

 

Como resultado destas iniciativas, “alguns alunos instalaram comedouros nas suas casas com a ajuda dos pais”, recorda o professor, lembrando que “ao longo do ano foram vários os relatos acerca de avistamentos nesses comedouros”. O ‘feedback’ dos pais relativamente aos documentários “foi também muito positivo”.

Se continuar na mesma escola durante os próximos anos, André Brandão promete que “todos os avistamentos de animais selvagens serão alvo de atenção”. “São óptimos temas a partir dos quais se podem trabalhar todas as disciplinas. Para além disso, é importante que os alunos conheçam a Natureza para que a consigam proteger devidamente.”

 

Espetadas de amendoins, que servem de alimento para as aves. Foto: André Brandão

 

Para já, os alunos parecem estar bem encaminhados. Tornou-se habitual ouvir frases na sala de aula como “Estava um chapim-real na espetada de amendoins e um pisco-de-peito-ruivo num ramo da árvore!”, em especial após idas à casa-de-banho. “Penso que isto é muito bom sinal. Conhecendo, vão proteger”, sublinha o professor.

 

[divider type=”thin”]Agora é a sua vez.

André Brandão descreve quais foram os comedouros que foram instalados no recreio da escola este ano lectivo, de forma a que os alunos pudessem observar e conhecer melhor as aves. E porque não fazer o mesmo?

“Este ano, em vez de comedouros feitos a partir de embalagens Tetrapak, optámos por usar uma garrafa transparente, de modo a que se conseguisse ver melhor os seus visitantes.

Para além desse comedouro, instalámos um outro, de acrílico transparente no vidro da janela (…), o que permitiu observar chapins a menos de um metro.

Para além dos comedouros referidos, voltámos a utilizar ‘espetadas de amendoins’. Os amendoins são literalmente espetados num arame, que é depois pendurado num ramo da árvore. Este tipo de comedouro, como obriga as aves a perfurarem a casca para chegarem à semente, permite observações mais prolongadas.”

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.