Coruja-do-nabal (Asio flammeus). Foto: David Grabovac

Cientistas revelam o surpreendente estilo de vida nómada da coruja-do-nabal

Os resultados desta investigação mostram que a coruja-do-nabal (Asio flammeus) percorre distâncias inesperadamente longas e que nidifica em locais muito distanciados entre si.

Segundo os investigadores, entre eles cientistas da Estação Biológica de Doñana e do IREC-CSIC, as corujas estudadas viajaram muito pela Europa e Norte de África. Alguns indivíduos foram seguidos durante a nidificação ao longo de duas temporadas e as distâncias entre os locais de nidificação usados pelos mesmos indivíduos em anos consecutivos variaram entre 41 e 4.216 quilómetros.

“Até onde sabemos, estas representam algumas das maiores distâncias conhecidas entre locais de nidificação de qualquer ave”, comenta a Estação Biológica de Doñana em comunicado. “É incrível mas uma fêmea marcada no seu ninho na Escócia reproduziu-se duas vezes no mesmo ano, uma na Escócia e outra na Noruega.”

Estes movimentos surpreendentes parecem dever-se à necessidade de encontrar locais com presas suficientes para sustentar ninhadas grandes. A abundância da presa favorita das corujas-do-nabal, a ratazana, pode variar muito tanto em tempo como em espaço, o que torna estes roedores num recurso alimentar imprevisível.

Ainda que as corujas-do-nabal possam mudar de presas quando não há ratazanas, a sua resposta mais habitual é deslocar-se para outras zonas, o que origina movimentos nómadas, ainda que estes acarretem consequências a nível da sobrevivência: menos de metade dos indivíduos adultos sobrevivem de um ano para o outro.

Os tipos de movimentos registados nesta investigação, assim como a sua escala, implicam que não há várias populações em grande parte da Europa mas sim uma única população potencialmente integrada na maior parte da área de distribuição da espécie. Os autores deste estudo, publicado em Janeiro na revista IBIS (International Journal of Avian Science), acreditam que “este novo conhecimento tem implicações significativas para os esforços de conservação da coruja-do-nabal, dado que salienta a necessidade de planear as medidas de conservação da espécie a escalas maiores do que as consideradas até ao momento”.

A coruja-do-nabal é uma ave com dimensões médias que em Portugal pode ser encontrada de forma bastante localizada, principalmente em zonas húmidas como estuários, pauis, lagoas e albufeiras. É também a única ave de rapina nocturna que não se reproduz no nosso país, pelo que raramente se ouve e é mais difícil de encontrar. Como resultado, é uma das corujas mais enigmáticas em território português.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.