Espanha enfrenta um declínio generalizado das aves ligadas ao meio rural

O sisão é uma das espécies que poderão ser mais afectadas pela construção da barragem, afirma a C6. Foto: Pierre Dalous/Wiki Commons

Os resultados do terceiro Atlas das Aves Reprodutoras em Espanha mostram “uma descida da maioria das espécies vinculadas aos meios agrários”, avisa a Sociedade Espanhola de Ornitologia (SEO), ligada à Birdlife.

O declínio populacional estimado para as aves do meio rural é estimado em 27 por cento em menos de três décadas, tendo em conta os dados obtidos pelo programa Sacre, que se dedica ao seguimento das aves na Primavera.

O sisão, a abetarda, a codorniz, a laverca, o chasco-ruivo e a perdiz-comum são algumas das espécies mais afectadas, de acordo com os dados do terceiro Atlas das Aves Reprodutoras em Espanha coordenado pela SEO, documento que inclui a distribuição, tendências e populações das 450 espécies que ocorrem em Espanha na Primavera.

O problema que se faz sentir leva os especialistas a qualificarem as aves do meio rural como “o grupo de aves mais ameaçado da Península Ibérica”, indica em comunicado a organização não governamental espanhola.

Mas quais são as causas? O declínio de 94,8% do rouxinol-do-mato (Cercotrichas galactotes), por exemplo, “põe em evidência as mudanças negativas que aconteceram no habitat da espécie devido à intensificação de culturas lenhosas como a videira e a oliveira”.

As mudanças que estão a acontecer no meio rural em Espanha são uma tendência comum que leva ao declínio generalizado das aves que aí habitam. O campo espanhol enfrenta “a progressiva transformação e intensificação da agricultura, focada sobretudo na produtividade, com o uso generalizado de produtos anti-pragas e herbicidas.”

A essas alterações juntam-se outras, como “a expansão de monoculturas e a simplificação da paisagem”, “a transformação de grandes áreas de sequeiro em regadio” e a “utilização de sementes com produtos altamente tóxicos”.

Os resultados traduzem-se, aponta a SEO, na “pioria e redução dos habitats”, “diminuição de insectos (menos 76% na Europa desde 1990) e das plantas com semente como fonte de alimentação” e ainda na redução dos terrenos disponíveis para estas aves fazerem os seus ninhos.

A estes factores negativos juntam-se as novas unidades industriais e de transporte e ainda os projectos de energia renovável, em especial energia fotovoltaica. Essas construções, “em grande medida, ocupam os habitats preferidos por estas espécies, injustificadamente considerados espaços de pouco valor.”

Aves estepárias são as mais ameaçadas

A situação é mais sensível para as aves ligadas a ambientes agro-estepários, indica a ONG espanhola. Tal como acontece em Portugal, estas são zonas semiáridas com diferentes tipos de pastagens que ao longo da sua história passaram por transormações devido à acção humana. Tornaram-se assim grandes áreas de cultivos de cereais e de leguminosas como a alfafa, utilizados por muitas espécies de aves típicas das estepes.

O sisão, por exemplo, acusa uma descida populacional de 68,5 por cento entre 1998 e 2018, enquanto que a abetarda terá sofrido um declínio de 15% na última década. O cortiçol-de-barriga-preta e o cortiçol-de-barriga-branca também estão em maus lençóis, com descidas de 34 e de 19 por cento entre 2005 e 2019.

A SEO acrescenta ainda que “a conservação das aves agrárias está ligada às dinâmicas de intensificação e de abandono, assim como a determinadas práticas agrícolas”. O objectivo desta ONG é que “a Política Agrícola Comum impulsione e premie os sistemas e práticas que beneficiam a biodiversidade sem minar a rentabilidade do agricultor”.

Em Portugal, tem-se registado igualmente uma tendência negativa de muitas aves ligadas ao meio rural, de acordo com os dados recolhidos pela Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves durante os últimos anos.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.