Esta é Bujaraiza, o quebra-ossos que visitou Portugal

Bujaraiza, com pouco mais de um ano de idade, entrou em Portugal na manhã de 23 de Maio, vinda da Andaluzia. A visita deste quebra-ossos, que durou dois dias, foi um acontecimento raro em Portugal. Saiba por onde esta ave andou.

 

Esta fêmea, juntamente com os machos Miguel e Rayo, foi libertada a 31 de Maio de 2014 no Parque Natural das Sierras de Cazorla, Segura e las Villas (Jaén), no âmbito do Projecto de Reintrodução do Quebra-ossos na Andaluzia.

Cerca de um ano depois, de 23 a 25 de Maio, Bujaraiza esteve em Portugal, país onde a espécie (Gypaetus barbatus barbatus) se extinguiu há mais de 100 anos.

Pedimos os dados do seguimento de satélite de Bujaraiza aos responsáveis pelo seguimento dos quebra-ossos libertados na Andaluzia e seguimos a viagem desta jovem quebra-ossos.

Esta fêmea juvenil entrou em Portugal na manhã de dia 23 de Maio pela zona da Reserva Natural da Serra da Malcata, onde passou todo o dia e a noite. No dia seguinte começou a dirigir-se para o litoral, passando por cima da albufeira da barragem de Meimoa. Às 14h00 estava na Serra da Estrela e uma hora depois, às 15h00, estava em Tondela. Foi aí que decidiu virar e voar para Norte, até à Serra de São Macário, onde passou a noite.

 

Bujaraiza. Foto: Projecto de Reintrodução do Quebra-ossos na Andaluzia

 

No dia 25 de Maio continuou a viagem para Norte, até perto da Ermida da Nossa Senhora do Castelo, no alto da serra. A partir daí virou para Este, em direcção à fronteira com Espanha. Passou por Vila Nova de Paiva, sobrevoou Celorico da Beira e às 16h00 já estava de regresso a Espanha, na Serra da Gata.

Na sua viagem, Bujaraiza atingiu uma altitude máxima de 2040 metros (perto de Fornos de Algodres) e uma velocidade máxima de 87 quilómetros por hora.

Até ao momento já foram libertados 31 quebra-ossos pelo projecto de reintrodução do quebra-ossos na Andaluzia, que começou em 2006. Este ano foram libertados seis jovens quebra-ossos.

 

Bujarayza e Miguel. Foto: Projecto de Reintrodução do Quebra-ossos na Andaluzia
Bujarayza e Miguel. Foto: Projecto de Reintrodução do Quebra-ossos na Andaluzia

 

“Ainda que os jovens libertados tendam a regressar à área de libertação quando chegarem à maturidade sexual, durante a sua fase imatura realizam grandes dispersões, percorrendo toda a Península Ibérica e este é o caso de Bujaraiza em Portugal”, contou José Ramón Benítez Izaguirre, coordenador do seguimento dos quebra-ossos libertados, à Wilder.

Segundo Izaguirre, Bujaraiza está a fazer movimentos juvenis dispersivos porque ainda não chegou à idade de se reproduzir, normalmente entre os seis e os sete anos.

“O normal é que regresse para se reproduzir na Andaluzia. Mas também é possível que o faça noutro lugar já que uma pequena proporção destes exemplares fazem isso para assegurar a capacidade colonizadora da espécie”, acrescentou.

O quebra-ossos extinguiu-se na Andaluzia na década dos anos 80 do século XX devido aos envenenamentos e à perseguição humana directa. Desde então só existia uma população em Espanha, a pirenaica. O cenário alterou-se com os nove anos do projecto de reintrodução da espécie, impulsionado pela Junta de Andaluzia e pela Fundação Gypaetus.

“Todas as aves libertadas provêm da reprodução em cativeiro em vários centros, entre eles um na Andaluzia. Estes centros proporcionam todos os anos as crias necessárias à reintrodução em vários pontos da Europa, fundamentalmente nos Alpes Austríacos, suíços, italianos e franceses, assim como na Andaluzia”, explicou Izaguirre.

Todos os animais libertados estão equipados com transmissores GPS de satélite.

Actualmente há dois casais reprodutores e um deles –Blimunda e Tono – tem a primeira cria nascida em liberdade desde a extinção da espécie.

 

[divider type=”thin”]Saiba mais sobre o quebra-ossos:

Como é um quebra-ossos: esta é uma ave com quase três metros de envergadura de asa e até oito quilos de peso. A plumagem pode ser muito escura na sua fase juvenil e tornar-se mais clara com as sucessivas mudas. Mas talvez o que melhor a caracteriza são as barbas escuras perto do bico e o vermelho vivo em redor dos olhos.

Onde nidifica: nas saliências rochosas das grandes cadeias montanhosas.

O que significa o seu nome científico: em Latim, Gyp quer dizer abutre, aetus quer dizer águia e barbatus quer dizer com barba.

Alimenta-se de quê: esta ave é a única do planeta que se alimenta quase exclusivamente de ossos, principalmente de ungulados. Pode chegar a alimentar-se de ossos com 20 centímetros, que digere graças ao seu potente estômago. Quando não os consegue comer inteiros, agarra neles com as suas garras e lança-os de grandes alturas em zonas rochosas para os quebrar.

Quais as maiores populações de quebra-ossos na Europa: esta é uma espécie em perigo de extinção no Velho Continente. As maiores populações são as da cordilheira Pirenaica, da Córcega e Creta. A nível mundial, a União Internacional para a Conservação da Natureza classificou-a como Quase Ameaçada.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.