Foto: Joana Bourgard / Wilder

Lançado alerta para cortes rasos de árvores na Serra da Lousã

A Coligação C7, que reúne sete organizações ambientalistas portuguesas, alerta para as consequências das “fracas políticas de conservação da natureza” no país, espelhadas nos cortes rasos de árvores na Serra da Lousã, numa área de Reserva Ecológica Nacional e Rede Natura 2000.

Nas últimas semanas foram notícia os cortes rasos de árvores, sobretudo pinheiros-bravos adultos, no Casal da Silveira, na Serra da Lousã. Tratar-se-á de uma zona de encosta com elevado risco de erosão onde é autorizado o corte raso de uma extensão de 25 hectares, segundo a C7. A área está inserida na Zona Especial de Conservação (ZEC) da Serra da Lousã, parte integrante da Rede Natura 2000 e também na Reserva Ecológica Nacional (REN).

Entre outros, recorda a coligação, “esta intervenção irá contribuir para a erosão do solo e para a criação de condições mais favoráveis à instalação de espécies exóticas invasoras numa zona que já está significativamente degradada”. 

“As atenções têm estado dirigidas para a possibilidade do responsável pelos cortes não ser o legítimo proprietário nem ter autorização deste, o que terá, alegadamente, resultado na emissão de dois embargos administrativos, uma queixa-crime e, finalmente, numa providência cautelar para tentar suspender os trabalhos do empreiteiro florestal”, escreve a coligação numa Carta Aberta entregue ao ministro Ministro do Ambiente e da Ação Climática, Duarte Cordeiro.

Para Filipa de Jesus Gouveia, dirigente da LPN – Liga para a Protecção da Natureza, “não é admissível que quatro anos depois da condenação de Portugal no Tribunal Europeu por incumprimento da Diretiva Habitats, o Estado português continue com atrasos tão significativos na efetiva implementação, gestão e proteção da Rede Natura 2000”.

No entanto, as organizações que compõem a Coligação C7 (ANP|WWF, FAPAS, GEOTA, LPN, Quercus, SPEA e ZERO) vêm alertar para “várias outras dimensões de um emaranhado de problemas ambientais que estes cortes rasos de árvores vêm colocar a descoberto mas que, devido aos mecanismos legais vigentes e à fraca atuação do Estado, resultaram num mero auto de notícia pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) sobre a abertura não autorizada de caminhos”.

“Quando se pretende cortar mais de 10 árvores, é necessária a comunicação prévia ao ICNF, na sequência da qual é emitido um Manifesto de Corte de Árvores pelo Sistema de Informação de Manifesto de Corte (SiCorte) do ICNF. Contudo, tal não se revela suficiente. É essencial que a legislação garanta critérios de identificação de que quem faz a declaração tem a autorização do legítimo proprietário, situação que não está a ser assegurada atualmente pelo ICNF.”

Neste contexto em particular, e estando a área afetada inserida na tipologia de “Áreas com risco de erosão” da REN, é entendimento da Coligação C7 que a destruição do revestimento vegetal em curso, mesmo tratando-se de operações de exploração dos espaços florestais, pode colocar em causa as funções da respetiva área e, como tal, deveria ser alvo de uma comunicação prévia devidamente fundamentada. 

A Coligação lamenta que, apesar de pertencer à Rede Natura 2000, o plano de gestão desta [e outras] ZEC do país “ainda não tenha saído da gaveta, fazendo com que se percam sucessivas oportunidades de implementação de medidas de conservação”. “Estas medidas podem ir desde intervenções diretas sobre os diferentes habitats e espécies-alvo, fiscalização, monitorização e sensibilização, a medidas que visem preventivamente, e por via regulamentar, salvaguardar os valores naturais alvo de determinados fatores ou pressões humanas, com a regulação de atividades.”

Os conservacionistas pedem uma solução para a “falta de fiscalização no terreno, por falta de meios humanos, recursos financeiros ou estratégia, (…) sob risco de perdermos os valores naturais que levaram à classificação destes espaços”.

“Neste caso, de acordo com o próprio ICNF, foi uma comunicação da Câmara Municipal da Lousã que levou à deslocação da equipa de Vigilantes da Natureza ao local, na sequência da qual detetaram a abertura ilegal de caminhos naquela área da Rede Natura 2000. Além dessa situação, a Coligação C7 alerta para o conhecimento geral da existência no território de madeireiros que efetuam cortes ilegais que, quando detetados pelo proprietário, são muitas vezes resolvidos com acordo de preços acima do valor de mercado, para silenciar o problema. Uma situação que dificilmente aconteceria com uma presença regular do corpo nacional de vigilantes no terreno.”

Assim, em Carta Aberta, a Coligação C7 apela ao Ministro do Ambiente e da Ação Climática para que se promova a aplicação no terreno dos planos de gestão na Rede Natura 2000, para que se reforce a capacidade e presença do ICNF em todas as áreas do Sistema Nacional de Áreas Classificadas e para que seja alterada a regulamentação legal para a execução de cortes de arvoredo maduro de um modo geral e das espécies autóctones em particular, “no sentido de proteger o pouco que resta dessas florestas e de assegurar a conservação do solo, os recursos hídricos e prevenção de riscos naturais (de enxurradas, fogos florestais, etc.).

Além disso, a Coligação pede ainda a criação de “mecanismos (incluindo financeiros) para a implementação de programas a longo prazo, no mínimo 20 anos, para monitorizar e controlar as espécies exóticas invasoras em todo o território nacional (uma necessidade já identificada, mas para a qual o Fundo Ambiental não está preparado para dar resposta)”.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.