Aves marinhas. Foto: Wilder/arquivo

Parques eólicos offshore: Estudo alerta para efeitos sobre aves marinhas, em especial na Ericeira e em Viana do Castelo

Primeiros resultados de avaliação realizada pelo laboratório de investigação cE3c – Centro de Evolução, Ecologia e Mudanças Ambientais, em parceria com a SPEA, chamam a atenção para necessidade de debate sobre projectos de energias renováveis no mar.

O estudo sobre os impactos da instalação de parques eólicos ‘offshore’ ao largo da costa portuguesa, financiado pela Fundação Oceano Azul, avaliou a sensibilidade de 34 espécies de aves marinhas face aos locais que estão previstos para a instalação das turbinas.

Os resultados indicam que tanto a área proposta da Ericeira como as de Viana do Castelo Norte e Viana do Castelo Sul são as áreas “onde os impactos devem ser considerados e a localização e/ou delimitação destas áreas revista”, sublinha um comunicado conjunto da Fundação Oceano Azul e da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), divulgado esta terça-feira.

As zonas ao largo da Ericeira e de Viana do Castelo fazem parte das cinco áreas da costa continental portuguesa que o Governo já apontou como interessantes para a instalação de turbinas eólicas no mar em larga escala. As restantes ficam ao largo de Leixões, Figueira da Foz e Sines. “O estudo mostra que é fundamental que se debata, analise e estude os potenciais impactos e as zonas preferenciais” para a instalação desta indústria de energias renováveis, apelam as duas entidades.

Parque eólico ‘offshore’ no Reino Unido. Foto: Nicholas Doherty/Unsplash

Ericeira sobrepõe-se a proposta para área marinha protegida

Uma das questões que preocupam tanto a SPEA como a fundação que gere o Oceanário de Lisboa é que a zona proposta para a instalação de turbinas eólicas, no mar da Ericeira, sobrepõe-se à área que já tinha sido estudada numa expedição científica em Outubro do ano passado. Os resultados desse “levantamento de valores naturais” realizado há um ano vão servir de base à proposta para a criação da futura Área Marinha Protegida de Iniciativa Comunitária de Cascais, Mafra e Sintra, “área essa com valores naturais únicos apontados no relatório desta expedição”, com apresentação prevista até ao final de Dezembro.

“No caso particular desta área – acrescentam as duas entidades – a mesma situa-se anexa a duas zonas de protecção especial (ZPEs), e em habitat utilizado como zona de alimentação da população nidificante de cagarras nas ilhas Berlengas.”

Cria de cagarra em ninho na Berlenga. Foto: Leonor Miranda

Este alerta para os efeitos para as aves marinhas e costeiras surge quando estas são “um dos grupos de animais mais ameaçados do mundo devido a impactos humanos como as capturas acidentais por artes de pesca e a poluição“, lembra o comunicado. São igualmente as principais vítimas do aumento da área ocupada por parques eólicos marinhos, “devido às colisões com as pás das turbinas ou ao efeito barreira criado pelos parques eólicos e sobretudo à perda de habitat que necessariamente acontecerá pela exploração de vastas áreas marinhas”.

Emanuel Gonçalves, coordenador científico e administrador da Fundação Oceano Azul, nota que a agenda da descarbonização é “fundamental”, mas também que “é fundamental cumpri-la de uma forma correcta, não cometendo erros que possam levar a problemas numa outra agenda tão ou mais importante, que é a da protecção e recuperação da biodiversidade”.

“É imperativo que este processo seja transparente, claro e ambicioso no que diz respeito ao envolvimento da sociedade no mesmo”,  sublinha por seu lado o presidente-executivo da SPEA, Domingos Leitão, lembrando ainda “é de extrema importância acautelar desde já impactos futuros para as aves marinhas, começando por evitar as zonas identificadas como sendo ecologicamente mais sensíveis”. 

Decisão nos próximos meses

Uma vez que o Governo deverá anunciar a curto prazo quais vão ser as áreas a licenciar, as duas entidades alertam também para a necessidade de se recorrer à “melhor informação técnico-científica” para a tomada de uma decisão.

No entanto, “Portugal não tem ainda um mapa claro das áreas prioritárias para a conservação marinha, que é fundamental para atingir os objectivos a que o país se propôs na agenda da biodiversidade, na convenção da diversidade biológica ou na protecção de 30% do seu mar até 2030”, alerta o comunicado conjunto.

Sendo assim, “os mapas de sensibilidade apresentados agora pela SPEA são uma valiosa ferramenta para sustentar a decisão final e devem ser tidos em conta pelos decisores”, sustentam.

Em breve, está previsto que a Direcção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos apresente um plano de afectação, incluindo uma proposta final de áreas para a instalação de parques eólicos ‘offshore’, além do relatório da avaliação ambiental estratégica realizada. O plano de afectação será alvo de consulta pública.

“Existe a ambição política de que o leilão das áreas definidas avance antes do final de 2023 e é fundamental que haja mobilização de conhecimento técnico-científico antes do avanço do projeto”, alertam a SPEA e a Fundação Oceano Azul.

 

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.