Gaivota-de-patas-amarelas. Foto: Diego Delso / Wiki Commons

O que está a acontecer: As gaivotas revezam-se a cuidar dos ovos

É nesta época que os casais de gaivotas partilham esforços na nidificação, em falésias ou em meio urbano. A Wilder falou com Nuno Oliveira, da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), que está a coordenar uma acção de ciência cidadã para sabermos mais sobre a nidificação destas aves nas cidades.

Se por estes dias observar um ninho de gaivota no seu terraço ou no cimo de um prédio, o mais provável é que seja de uma gaivota-de-patas-amarelas (Larus michaellis). Esta espécie está em Portugal ao longo de todo o ano – ao contrário de outra espécie também comum, a gaivota-de-asa-escura (Larus fuscus), que costuma ser invernante.

No âmbito de uma iniciativa de ciência cidadã lançada este mês pela SPEA, quem observar gaivotas na cidade – que são quase certamente gaivotas-de-patas-amarelas – pode registar esses dados para ajudar a saber mais sobre a situação actual da espécie. Mas o que andam estas aves a fazer?

Apesar de não serem migratórias, as gaivotas-de-patas-amarelas têm um carácter dispersivo, pelo que “durante o Inverno são mais errantes e andam um pouco por todo o lado”, descreve Nuno Oliveira. “Já tivemos registos da presença de gaivotas, que anilhámos nas Ilhas Berlengas, por toda a costa da Península Ibérica, e também desde o norte de França e sul de Inglaterra até Marrocos e à Mauritânia, sempre em zonas costeiras.”

Entretanto na Primavera, quando chega a época de reprodução, costumam voltar ao mesmo local, ano após ano. “E sendo uma ave colonial, a tendência é a população crescer como uma colónia, com a construção de ninhos próximos uns dos outros.”

Gaivotas na Lagoa do Fogo, Ilha de São Miguel, Açores. Foto: JCNazza / Wiki Commons

Por outro lado, não só regressam ao mesmo sítio onde nidificaram pela primeira vez, como a tendência é continuarem a juntar-se sempre com o mesmo parceiro. “É natural que assim seja, uma vez que as gaivotas vivem cerca de 20 anos e precisam de funcionar numa harmonia muito grande em casal, tanto para a incubação dos ovos como a alimentação das crias e a defesa do ninho”, nota o mesmo responsável. Como as gaivotas adultas não costumam alimentar outras gaivotas adultas, têm de revezar-se nas diferentes tarefas para cada uma ter tempo de procurar comida.

Logo em Abril, muitos casais já estão a construir os ninhos – sempre em sítios elevados de onde vigiam a zona em redor, mas onde ao mesmo tempo estão protegidos das intempéries. Por isso, “o habitat típico de nidificação são falésias”, mas numa cidade pode ser um telhado abrigado, exemplifica Nuno Oliveira. Palhas, penas e pedaços de ervas – ou de plástico – são usados na construção.

Cada ninho de gaivota costuma ter dois ou três ovos, de tom acastanhado, sarapintados com pequenas pintinhas castanho-escuras, mais ou menos com sete centímetros cada um. Passados 28 dias, em média, nascem as pequenas gaivotas, que três ou quatro dias depois já saem do ninho e começam a explorar o espaço ali à volta – mas sempre a pé, pois ainda vão demorar mais de um mês para começarem a voar.

Cria de gaivota. Foto: Drow male / Wiki Commons

Nestas primeiras semanas de vida, macho e fêmea revezam-se para tomar conta das crias. E há um cuidado especial na alimentação. “As gaivotas urbanas alimentam-se muito de resíduos urbanos, mas para as crias vão à procura de pescado, especialmente nos primeiros dias.” Hoje em dia estas aves quase não pescam, pois vão buscar o peixe aos barcos e aos portos de pesca. Outro alimento muito procurado é o caranguejo-pilado, “que tem um ‘boom’ a partir de Maio, exactamente durante esta época da nidificação.”

Mesmo se as gaivotas fazem ninho na cidade, aliás, não significa que ficam o dia todo por ali: “Estarem a nidificar no topo do prédio não quer dizer que se vão alimentar ao café da esquina.” Nuno Oliveira adianta que é normal viajarem num raio de 10 a 15 quilómetros, todos os dias, para irem buscar a comida de que precisam e também para as crias.

Juvenil de gaivota-de-patas-amarelas. Foto: Benjamin Janecke / Wiki Commons

Finalmente, mais de um mês após terem nascido – em média aos 37 dias – as pequenas gaivotas começam a voar e abandonam o ninho definitivamente, descreve o mesmo especialista. Ainda vão demorar cerca de três a quatro anos para adquirirem a plumagem de adultas: nas gaivotas-de-patas-amarelas, as asas deixam de ser acastanhadas e assumem um tom prateado e o bico fica amarelo com uma pinta vermelha na ponta. É nessa altura que começam a reproduzir-se.


Agora é a sua vez.

Assista a este vídeo da SPEA para saber como participar na campanha de ciência cidadã e contar as gaivotas urbanas.


Conte as Aves que Contam Consigo

A série Conte as Aves que Contam Consigo insere-se no projeto “Ciência Cidadã – envolver voluntários na monitorização das populações de aves”, dinamizado pela SPEA em parceria com a Wilder – Rewilding your days e o Norwegian Institute for Nature Research (NINA) e financiado pelo Programa Cidadãos Ativos/Active Citizens Fund (EEAGrants), um fundo constituído por recursos públicos da Islândia, Liechtenstein e Noruega e gerido em Portugal pela Fundação Calouste Gulbenkian, em consórcio com a Fundação Bissaya Barreto.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.