A cria de abutre-preto já voa na Herdade da Contenda

O primeiro abutre-preto a nascer no Alentejo nos últimos 40 anos é uma fêmea e já está a voar na Herdade da Contenda, em Moura, avançou hoje a Liga para a Protecção da Natureza (LPN). Com cerca de cinco meses, esta ave já está do tamanho dos pais. A 5 de Setembro celebra-se o Dia Internacional dos Abutres.

 

 

Eduardo Santos estava ontem às 07h30 da manhã no campo, no coração da Herdade da Contenda em Moura, no Baixo Alentejo, perto do ninho onde, há cerca de cinco meses, nasceu a primeira cria de abutre-preto (Aegypius monachus) do Alentejo dos últimos 40 anos.

“Estava sossegada no ninho, com comportamentos perfeitamente normais”, contou este técnico da LPN à Wilder. Eduardo é uma das pessoas por detrás da história de conservação desta espécie de abutre classificada como Criticamente em Perigo de Extinção. Nos últimos três anos tem acompanhado no terreno o regresso desta grande ave à região. Desde a montagem de 12 ninhos artificiais no topo das árvores da Contenda, em 2012, até à ocupação dos ninhos, passando pelo nascimento desta cria, em Abril passado, à anilhagem e marcação com GPS em Julho e agora aos primeiros voos, em meados de Agosto.

 

O juvenil já está do tamanho dos seus progenitores

 

“Na véspera de ir para o campo, à noite, estive a olhar para os dados do GPS para saber onde estaria a cria”, acrescentou. Isto porque, desde que ensaiou os primeiros voos, é mais difícil encontrar a ave. “Mas como à noite estava no ninho, sabia que, se fosse ao local no outro dia bem cedo, existiam boas possibilidades de a encontrar lá.” E foi o que aconteceu.

É uma “menina”

Por estes dias, a cria já é um juvenil e tem voado em redor do ninho, algumas centenas de metros, em voos “curtos e hesitantes”. Nada ainda de muito ambicioso. Contudo, está completamente desenvolvida e está já do tamanho dos pais. “As diferenças são apenas ao nível da cor da plumagem. Os juvenis são mais escuros que os adultos”, explicou Eduardo. Na fotografia mais recente, que ilustra este artigo, o juvenil ainda tinha a penugem da cabeça mais clara, mas hoje já está completamente preta. Quando fizer um ano de idade, fará a primeira muda de penas.

Outra novidade é que as análises ao sangue colhidas em meados de Julho já permitem saber que o juvenil é uma fêmea. “Nos abutres-pretos não há dimorfismo sexual, ou seja, os machos e as fêmeas são idênticos”, disse ainda.

Neste momento, o jovem abutre ainda é alimentado uma ou duas vezes por dia pelos adultos. Estima-se que só no final de Setembro se tornará totalmente independente, começando uma nova etapa da sua vida, em que tenderá a dispersar para qualquer ponto da Península Ibérica.

Enquanto isso não acontece, os técnicos conservacionistas e a Herdade da Contenda vão acompanhando as aventuras deste juvenil, através de GPS ou observando, pontualmente, a área envolvente ao ninho.

“Os abutres são extremamente importantes para manter a sanidade dos ecossistemas porque, ao consumirem carne morta, limpam os campos de carcaças e diminuem o risco de propagação de doenças”, explica a LPN em comunicado. O Dia Internacional dos Abutres,  celebrado todos os anos no primeiro sábado de Setembro, quer alertar a sociedade para a importância da conservação deste grupo de espécies, vitais para o ecossistema e que enfrentam um conjunto de ameaças, desde a perda de habitat, à morte por venenos ou colisão e eletrocussão em linhas elétricas e ainda à diminuição de alimento disponível.

Em Portugal, além do abutre-preto, ocorrem duas outras espécies de abutres, especialmente nas regiões fronteiriças do interior: o grifo (Gyps fulvus) e o abutre do Egipto ou britando (Neophron percnopterus) que, tal como o abutre-preto, se encontra bastante ameaçado de extinção.

 

 

[divider type=”thin”]Agora é a sua vez.

Observe os céus do Alentejo. Se vir esta cria de abutre-preto contacte os responsáveis da LPN. Para o ajudar, aqui fica tudo o que precisa de saber, para observar abutres-pretos.

Saiba mais sobre o Dia Internacional dos Abutres. A 5 de Setembro, o Parque Biológico de Gaia preparou duas actividades onde poderá participar. É o Atelier “Abutres, recicladores naturais”, às 11h00, e a conversa “O abutre e as suas ameaças”, às 14h30.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.