Uma das aves mais comuns da Eurásia está a desaparecer por causa da caça

A escrevedeira-aureolada (Emberiza aureola) pode vir a ter o mesmo destino que o pombo-passageiro, ave extremamente abundante caçada até à sua extinção em 1914. Um estudo publicado na Conservation Biology alerta que a população de escrevedeira diminuiu 90% desde 1980.

 

Esta escrevedeira é do tamanho de um pardal e tem penas de um amarelo-dourado.

Até há alguns anos atrás, era uma das aves mais comuns na Europa do Norte e na Ásia. Mas desde 1980, os ornitólogos têm registado declínios dramáticos em muitas regiões. De tal forma que nos últimos 18 meses, esta ave foi incluída na Lista Vermelha das espécies como Criticamente Ameaçada de extinção. A Lista Vermelha das Aves Europeias, apresentada no passado dia 3 de Junho, lista a espécie como uma das dez mais ameaçadas da Europa.

Cientistas da Alemanha, Inglaterra, Rússia, Finlândia e Japão fizeram o primeiro estudo deste declínio e publicaram agora os resultados. A maior causa é a caça ilegal na China, apontam.

A área de distribuição desta escrevedeira cobre a Finlândia a Oeste até à Rússia e Japão a Este. As aves voam sobre a China em direcção ao Sudeste Asiático onde passam o Inverno. Na década de 1980, os ornitólogos estimavam a população mundial em centenas de milhões de aves. Mas, desde então até 2013, a população registou um declínio de 90%, perdeu 5000 quilómetros da sua área de distribuição e na parte europeia da Rússia está praticamente extinta.

“A magnitude e velocidade do declínio não tem precedentes entre aves distribuídas sobre uma área tão extensa, à excepção do pombo-passageiro (Ectopistes migratorius) que se extinguiu em 1914 por causa da caça a larga escala”, comenta em comunicado Johannes Kamp, da Universidade de Munster e principal autor do artigo, publicado ontem.

Na China, desde 1997 é proibido capturar aves canoras. Mas acontece que cada vez mais aves são capturadas durante as suas migrações porque são consideradas uma iguaria gastronómica. “Apesar de o Governo chinês tentar travar a captura ilegal desta escrevedeira, é muito fácil comprar estas aves no mercado negro”, diz o ornitólogo japonês Simba Chan, co-autor do estudo e representante da federação Birdlife International na Ásia. Numa única intervenção em Novembro de 2011, as autoridades chinesas apreenderam dois milhões de aves em duas cidades da província de Anhui, no Sul da China. Entre essas aves estavam 20.000 escrevedeiras-aureoladas. Os cientistas estimam que vários milhões destas aves sejam capturadas todos os anos no Sudeste Asiático.

“Precisamos de mais estudos bons e sistemáticos sobre as populações de aves migradoras na Ásia”, comenta Simba Chan. “Com apoio internacional talvez possamos conseguir reverter esta tendência de declínio da população de escrevedeira-aureolada e de muitas outras espécies de aves.”

A Birdlife International defende “acções de monitorização urgentes e coordenadas na Ásia Oriental”, escreve em comunicado. O primeiro passo para isso será conseguir um novo acordo entre a China, Japão, República da Coreia e Rússia. “A situação actual é tão grave que o Convénio de Espécies Migratórias está de acordo em desenvolver um plano de acção internacional para recuperar a escrevedeira-aureolada em 2017”, acrescenta esta federação.

“Na última década, o turismo ornitológico popularizou-se muito na China”, diz Simba Chan. “Os amantes das aves terão um papel importante na compilação dos dados. Agora é altura de dar a conhecer este declínio preocupante por toda a região, mobilizando a cidadania em acções de conservação”, acrescenta.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.