Foto: Lorenzo Quaglietta

Lista Vermelha: Toupeira-de-água agrava risco de extinção e está agora Em Perigo

Início

Agravamento do estatuto deste mamífero nativo de Portugal foi anunciado pela União Internacional para a Conservação da Natureza, que alerta ainda para a situação preocupante das libélulas e libelinhas em todo o mundo.

A toupeira-de-água (Galemys pyrenaicus) é um mamífero semi-aquático que vive apenas em rios e ribeiras de montanha nos Pirinéus (Andorra e França), no Centro e Norte de Espanha e no Norte de Portugal, e que viu agora o seu risco de extinção agravar-se e passar de Vulnerável a Em Perigo. Entre este novo patamar e a extinção na natureza resta apenas um degrau (Criticamente em Perigo).

“Esta espécie pouco comum é aparentada com as toupeiras e tem um nariz longo e sensível e umas patas largas e ramificadas”, descreve a IUCN – União Internacional para a Conservação da Natureza, num comunicado sobre a última revisão da Lista Vermelha, divulgado esta semana.

Fonte: IUCN

A singularidade deste mamífero deve-se também ao facto de ser “um dos últimos da sua linha evolucionária”, uma vez que nos mundo restam hoje apenas duas espécies de toupeiras-de-água. [A outra espécie é a Desmana moschata, conhecida em inglês por toupeira-de água-da-Rússia (‘russian desman’) e nativa desse país e de outros países próximos.]

Quanto à população da toupeira-de-água Galemys pyrenaicus, “decresceu na sua área de distribuição em 50% desde 2011, devido a grandes impactos humanos nos seus habitats”, avisa a IUCN, que junta 1.400 organizações de todo o mundo e é considerada a autoridade mundial na avaliação do risco de extinção das espécies.

Há pelo menos três anos que os alarmes já tinham soado em Portugal. Em 2018, um estudo publicado a 20 de Junho na revista científica Animal Conservation por uma equipa de cinco investigadores do CIBIO-InBIO avisou que nos últimos 20 anos, este animal desaparecera de 63,5% dos locais onde existia nas bacias do Tua e do Sabor.

Toupeira-de-água (Galemys pyrenaicus). Foto: Lorenzo Quaglietta

Os principais problemas que ameaçam a sobrevivência destas toupeiras, segundo a IUCN? O aumento de obstáculos ao livre fluxo dos rios e a existência de níveis reduzidos de água, tudo isto em resultado de barragens hidroeléctricas, diques e construção de reservatórios e também devido à extracção de água usada para a agricultura.

Como resultado, “áreas significativas tornam-se inóspitas para a toupeira-de-água”, e não só. As populações deste mamífero ficam isoladas e os seus abrigos e presas estão a reduzir-se fortemente.

Mas há ainda outras ameaças que colocam a espécie Em Perigo: espécies exóticas invasoras; pesca ilegal com recurso a venenos, redes e explosivos; secas crescente devido às alterações climáticas; escavação de leitos e de margens de rios; poluição dos cursos de água.

Toupeira-de-água. Foto: ©Joel Sartore – PhotoArk Project

“Preservar e restaurar o fluxo natural dos rios e a vegetação em redor, controlar as espécies exóticas invasoras e lidar com as alterações climáticas são a chave para a recuperação desta espécie”, avisa a organização internacional.

Libélulas e libelinhas também preocupam

Mas a toupeira-de-água não é o único caso preocupante. Muito longe disso.

A Lista Vermelha que foi agora revista inclui actualmente o risco de extinção para 142.577 espécies de animais, plantas e fungos selvagens de todo o mundo – um número que cresce continuamente, a partir do trabalho de peritos que colaboram com a organização internacional. E na revisão agora anunciada, pela primeira vez, foram consideradas ameaçadas de extinção mais de 40.000 das espécies que constam da Lista. Mais exactamente, 40.084 espécies.

Entre os grupos em pior situação, os especialistas apontam o das libélulas e libelinhas: 16% de um total de 6.016 espécies da Lista Vermelha estão agora em risco de extinção, devido à deterioração dos corpos de água de que dependem. Na verdade, o seu ciclo de vida está intimamente ligado àqueles.

Libelinha lestes-comum (Chalcolestes viridis). Foto: Quartl/WikiCommons

“Ao revelar a perda global de libélulas, a revisão da Lista Vermelha salienta a necessidade urgente de protegermos as zonas húmidas do mundo e a rica tapeçaria de vida que estas abrigam”, alertou o director-geral da IUCN, Bruno Oberle, citado no comunicado. “A nível mundial, estes ecossistemas estão a desaparecer três vezes mais depressa do que as florestas.”

Oberle lembrou também a importância destas áreas do planeta que muitas vezes parecem “improdutivas e inóspitas” para os humanos, mas que fornecem “serviços essenciais”: “Armazenam carbono, dão-nos água limpa e comida, protegem-nos das cheias e oferecem havia a uma em cada dez espécies conhecidas no mundo”, reiterou.

Já as ameaças que pendem sobre as libélulas e libelinhas são várias por todo o mundo. Desde os pesticidas e as alterações climáticas, apontados como o problema principal na Europa e América do Norte, ao desbaste de zonas húmidas e florestas tropicais no Sul e Sudeste Asiáticos – onde mais de um quarto das espécies deste grupo estão em perigo – para culturas como a do óleo de palma.

Já na América Central e do Sul, estes insectos estão em declínio principalmente devido ao abate de florestas para construção residencial e comercial.

Libélula imperador-azul (Anax imperator). Foto: Andreas Eichler/Wiki Commons

“As libélulas são indicadores altamente sensíveis do estado dos ecossistemas de água doce e esta primeira avaliação global finalmente revela a escala do seu declínio”, considerou por seu turno Viola Clausnitzer, co-presidente do Grupo de Especialistas da IUCN para as Libélulas.

“Para conservarmos estes lindos insectos, é crítico que os governos, a agricultura e a indústria tenham em conta a protecção dos ecossistemas de zonas húmidas no âmbito de projectos em desenvolvimento, protegendo por exemplo habitats-chave e dedicando espaço para zonas húmidas urbanas.”


Saiba mais.

Recorde estas cinco coisas que Portugal pode fazer para salvar a toupeira-de-água e quais são as principais características deste mamífero, no Livro Vermelho dos Mamíferos de Portugal Continental. E descubra porque é que libélulas e libelinhas têm uns olhos tão grandes – uma das características que fazem destes insectos seres tão fascinantes.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.