Foto: Allison Jones

Como fazer crescer o jardim na primavera?

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Na série “Abra espaço para a natureza”, Carine Azevedo responde às dúvidas que temos quando pensamos em tornar um espaço mais amigo do mundo natural. Desta vez, algumas úteis sugestões sobre a propagação de plantas.

A primavera é a estação da renovação, com a natureza a despertar do seu sono invernal e os jardins a ganharem a vida. Este é o momento perfeito para começar a explorar técnicas simples de multiplicação de plantas e assim aumentar a variedade de espécies e a beleza do jardim.

Descubra algumas técnicas simples de propagação de plantas e explore algumas espécies que respondem bem a estas técnicas, impulsionando a transformação dos espaços verdes.

Sementeira

A reprodução por semente é uma das formas mais simples de propagar plantas. Basta escolher sementes de plantas saudáveis, semeá-las em solo fértil, leve, bem arejado e com boa drenagem, e garantir boas condições de luz e humidade. Para iniciar a sementeira deve optar-se por vasos pequenos ou tabuleiros.

As sementes, quando colocadas no solo, não devem ser enterradas profundamente. A profundidade ideal varia dependendo do tipo de planta e do tamanho da semente.

Para as sementes pequenas recomenda-se que estas fiquem praticamente à superfície do solo. Depois de colocadas na terra, as sementes podem ser cobertas com uma camada muito fina de solo ou podem ser apenas aconchegadas no solo com um ancinho ou um garfo, sem as enterrar demasiado. 

Já para sementes de tamanho médio ou grande, sugere-se que sejam enterradas a uma profundidade que seja aproximadamente duas a três vezes o seu tamanho. Este é o ponto de partida para proporcionar um ambiente adequado à germinação.

Idealmente, antes de iniciar a sementeira, deve garantir-se que o solo esteja húmido, sobretudo no caso de sementes de dimensão muito reduzida, para que estas não fiquem a boiar sobre a água, uma vez que ficarão à superfície.

Para garantir uma germinação bem-sucedida, ou seja, que as sementes germinem com sucesso, é fundamental mais alguns cuidados específicos:

– A água é crucial para iniciar a germinação. Deve-se manter o solo consistentemente húmido para que as sementes absorvam a humidade necessária para iniciar o processo de germinação;

– A maioria das sementes requer temperaturas específicas para germinar, mas geralmente, temperaturas entre os 18ºC e os 24ºC são ideais para desencadear o processo de germinação.

Papoila-brava (Papaver rhoeas). Foto: George Chernilevsky/WikiCommons

Se adquirir as sementes, siga as instruções específicas que as acompanham, sobre o tipo de solo, profundidade de sementeira, temperaturas e outros fatores, para garantir o sucesso da germinação. 

A germinação das sementes nem sempre ocorre simultaneamente, pois as taxas de germinação são distintas de espécie para espécie. Além disso, no mesmo lote de sementes de uma determinada espécie pode ocorrer alguns desfasamentos, muitas vezes associados à qualidade das sementes, às condições ambientais, entre outros. É necessário dar-lhes tempo e paciência.

À medida que as novas plantinhas germinadas crescem, estas devem ser transplantadas para vasos maiores antes de as plantar nos seus lugares definitivos no jardim. A transplantação proporcionará espaço suficiente para que as raízes se desenvolvam plenamente e as plantas se adaptem gradualmente às condições futuras.

As plantas aromáticas e as plantas anuais, de uma maneira geral, germinam com facilidade. Também existem muitas espécies perenes, herbáceas, arbustivas e arbóreas que se reproduzem facilmente através de semente, embora demorem mais tempo a desenvolver-se.

Malva-real. Foto: Agnieszka Kwiecień / Wiki Commons

Alguns exemplos de plantas nativas que se reproduzem facilmente através de semente são:

Papoila (Papaver rhoeas)

– Tremoço-azul (Lupinus angustifolius)

Malva-real (Lavatera trimestris)

– Malmequer (Glebionis coronaria)

– Damas do bosque (Nigella damascena)

Alecrim (Salvia rosmarinus)

– Cebolinho (Allium schoenoprasum)

Erva-cidreira (Melissa officinalis)

– Funcho (Foeniculum vulgare)

– Hortelã (Mentha spp.)

– Orégãos (Origanum vulgare)

Perpétua-das-areias (Helichrysum italicum subsp. picardi)

Poejo (Mentha pulegium)

Poejo. Foto: Gardenology.org

Rosmaninho (Lavandula stoechas)

– Tomilho (Thymus spp.)

Flor-de-mel (Lobularia maritima)

– Roselha (Cistus crispus)

Bocas-de-lobo (Antirrhinum majus)

Gilbardeira (Ruscus aculeatus)

– Assembleias (Iberis procumbens)

– Tomilho-de-creta (Thymbra capitata)

Estevinha (Cistus salviifolius)

Estevinha. Foto: Peter A. Mansfeld / Wiki Commons

– Sargacinha-branca (Halimium umbellatum)

– Sargacinha-amarela (Halimium calycinum)

Medronheiro (Arbutus unedo)

Murta (Myrtus communis)

Madressilva (Lonicera etrusca)

Sanguinho-das-sebes (Rhamnus alaternus)

Trovisco (Daphne gnidium)

Sobreiro (Quercus suber)

Carvalho (Quercus spp.)

Loendro (Nerium oleander)

Flores de loendro. Foto: Konevi / Pixabay

De entre as espécies exóticas, as mais comuns são:

– Calendula (Calendula officinalis)

– Coentro (Coriandrum sativum)

– Erva-príncipe (Cymbopogon citratus)

– Hortelã-pimenta (Mentha piperita)

– Limonete (Aloysia citrodora)

– Manjericão (Ocimum basilicum)

– Manjerona (Origanum majorana)

– Tomilho-comum (Thymus vulgaris)

Flores de tomilho-vulgar. Foto: Salicyna/Wiki Commons

– Tomilho-limão (Thymus × citriodorus)

– Salsa (Petroselinum crispum)

– Sálvia (Salvia officinalis)

– Amores-perfeitos (Viola tricolor)

– Tagetes (Tagetes spp.)

 Estacaria

A estacaria é uma técnica de propagação vegetativa, em que a partir de um fragmento saudável de uma planta, geralmente um ramo ou caule, se obtém uma nova planta.

Esta técnica é comumente utilizada para propagar plantas que não se reproduzem facilmente a partir de sementes, ou quando se pretende preservar as características específicas de uma planta já existente.

A estacaria consiste em estimular o enraizamento de ramos ou caules saudáveis e jovens. Para começar deve escolher-se a planta-mãe e verificar se se encontra em bom estado fitossanitário e evitar que esteja em flor.

Aroeira. Foto: H. Zell / Wiki Commons

Com recurso a material de corte bem afiado e devidamente desinfetado, retira-se uma estaca, cujo tamanho varia consoante a espécie a propagar, mas deve ter pelo menos 10 a 15 centímetros de comprimento.

De seguida, removem-se as folhas que ficam na parte inferior da estaca e que vai ser enterrada para que ocorra o enraizamento. No caso de estacas com muitos nós, geralmente, segue-se a regra de enterrar dois terços da estaca no solo e deixar um terço de fora. As folhas que estão na superfície devem ser reduzidas a metade, ou seja, deve cortar-se cada uma das folhas a meio, de forma a reduzir-se a transpiração.

Outra dica que favorece o enraizamento consiste em fazer o corte da base da estaca imediatamente abaixo de um gomo, além de evitar que a porção de caule enterrada apodreça.  

Depois de preparadas as estacas, estas devem ser enterradas em solo fértil, bem drenado e leve. Para aumentar a taxa de sucesso da estacaria, podem utilizar-se hormonas de enraizamento, que estimulam o desenvolvimento de raízes na base do corte.

A estacaria pode ser feita diretamente no jardim ou em vasos, devendo garantir-se sempre que o solo esteja húmido, mas não encharcado e deve garantir-se que as estacas fiquem em locais com boa exposição à luz, mas preferencialmente sem sol direto. O tempo que as plantas demoram a enraizar varia de espécie para espécie. As plantas herbáceas geralmente enraízam mais facilmente do que as lenhosas, mas o tempo médio ronda um a três meses até que as plantas formem raízes.

Loureiro. Foto: David J. Stang/Wiki Commons

Esta técnica de propagação de plantas pode ser usada numa vasta diversidade de plantas lenhosas e herbáceas e é frequentemente utilizada para propagar variedades específicas de plantas, garantindo que as características desejadas sejam preservadas.

De entre as plantas que se destacam pela facilidade de propagação por estacaria, incluem-se espécies como: o alecrim, o loendro, a gilbardeira, o rosmaninho, a aroeira (Pistacia lentiscus), a tamargueira (Tamarix africana), o azereiro (Prunus lusitanica), o loureiro (Laurus nobilis), a lúcia-lima (Aloysia citrodora) e muitas outras dos géneros Rosa, Geranium, Dianthus, Chrysanthemum, Lavandula, Salvia, Hydrangea, Erica, Salix, Calluna, Betula, Thymus, Mentha, Escallonia, entre outros.

Já as begónias (Begonia spp.), as violetas-africanas (Saintpaulia spp.), as espadas-de-São-Jorge (Sansevieria spp.), as plantas suculentas e os cactos no geral, têm relativa facilidade de se reproduzirem através de folhas ou mesmo fragmentos de folhas. 

Este tipo de estacaria consiste em cortar a nervura principal da folha e colocá-la sobre o solo. A folha deve permanecer nesta posição até que comecem a surgir raízes na zona do corte, e assim servir como base para uma nova planta. Outra técnica de estacaria de folhas implica enterrar verticalmente fragmentos de folhas ou até mesmo a folha inteira.

Suculenta. Foto: manseok Kim/Pixabay

No caso das suculentas e dos cactos, deve cortar-se as folhas e deixá-las secar ao ar durante 3 a 4 dias, antes de as enterrar ligeiramente no solo.

 Divisão

A divisão é uma técnica de propagação amplamente utilizada para multiplicar plantas perenes que tenham uma estrutura radicular que permite que uma planta seja dividida em várias partes menores. Além de permitir a obtenção de novas plantas, esta prática permite estimular o crescimento de novos rebentos, rejuvenescer a planta-mãe e controlar o tamanho das touças.

Lírio-amarelo, planta do género Iris. Foto: Marc Ryckaert/Wiki Commons

O processo de divisão pode variar de espécie para espécie, no entanto, existem algumas etapas gerais que devem ser tidas em conta para garantir o sucesso da operação. Depois de escolhida a planta a dividir, esta deve ser cuidadosamente desenterrada, para não danificar as raízes. 

De seguida, com o auxílio de uma ferramenta de corte, limpa e afiada, deve proceder-se à divisão da planta garantindo-se que ao dividi-la, cada nova planta tenha um sistema radicular saudável e um número adequado de rebentos. 

Rosa-albardeira, planta do género Paeonia. Foto: Geyersberg/Wiki Commons

Por fim, as novas plantas devem ser replantadas em vasos ou diretamente no jardim, e colocadas em locais protegidos, com temperaturas amenas e boa luminosidade, garantido que o solo seja leve, fértil e bem drenado, e que as novas plantas sejam regadas adequadamente para promover o seu estabelecimento.

Algumas das espécies perenes que se prestam à divisão pertencem aos géneros botânicos: Hemerocallis, Agapanthus, Iris, Hosta, Crocosmia, Paeonia, Salvia, Nepeta, Canna, Spathiphyllum, Ophiopogon, Leucanthemum, Sedum, Geranium, Saxifraga, Strelitzia, Aspidistra. Também diversos géneros de orquídeas, tais como Cattleya, Laelia, Cymbidium e Dendrobium, se adequam a este método de propagação.

Outras técnicas de propagação

Também existem algumas plantas que emitem estolhos, como é o caso do morangueiro (Fragaria spp.) e do clorófito (Chlorophytum spp.). A partir dos estolhos é possível a formação de novas plantas. Os estolhos são ramos que partem da planta e que quando estão em contacto com o solo facilmente emitem raízes. Quando as raízes atingem um tamanho adequado, basta cortar os estolhos e colocá-los noutro vaso e assim obter uma nova planta.

Outras plantas, como a hera (Hedera helix), por exemplo, que desenvolvem pequenas raízes aéreas ao longo do caule. A partir de fragmentos que contenham essas raízes, torna-se possível obter novas plantas.

Hera. Foto: kallerna/WikiCommons

Além destas técnicas de propagação mais simples, existe um vasto conjunto de outras técnicas de propagação mais complexas, como é o caso da enxertia, da mergulhia, e alporquia. Se estiver interessado em artigos dedicados a estas técnicas mostre o seu interesse nos comentários.

Na série “Abra espaço para a natureza” encontrará mais alguma informação que ajudará na escolha das espécies e nos cuidados a ter com as suas plantas. E se explorar a série “O que procurar: espécies botânicas”, irá encontrar um vasto leque de espécies nativas que se poderão adequar às diferentes condições do seu jardim.

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Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas. 

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